quinta-feira, agosto 11, 2011

Fotografia parcial da educação brasileira



Só vamos romper com esse atraso educacional quando algumas providências forem tomadas.
 
25/07/2011
Otaviano Helene
 
São muitos os problemas da educação brasileira. E para apontar os possíveis caminhos que devemos seguir para corrigi-los e, também, para entender como e quanto eles contribuem para o agravamento de outros problemas nacionais, tais como a concentração de renda, a pouca qualificação da força de trabalho, a falta de perspectivas de grande parte da nossa juventude ou o nosso atraso social, seria necessário analisá-los detalhadamente.
Entretanto, na impossibilidade de sequer citar todos os problemas do nosso sistema educacional em um curto artigo, uma visão geral do ensino fundamental pode fornecer uma fotografia que, embora parcial, ilustra bem nossa situação. Vejamos. Atualmente, cerca da terça parte das nossas crianças é excluída do sistema  educacional antes mesmo do final do ensino fundamental. Isso corresponde a cerca de um milhão de pessoas abandonando, a cada ano e em definitivo, o sistema  educacional. (Até o final do ensino médio a exclusão já terá atingido perto da metade das pessoas.) Além disso, boa parte daqueles que concluem o ensino fundamental o faz com enormes deficiências no aprendizado, como revelam os muitos testes e exames de desempenho estudantil.
A gravidade dessa situação é enorme, pois esses que hoje deixam o sistema escolar prematuramente estarão ativos, em termos econômicos e sociais, por cinco ou mais décadas. Se já hoje o ensino fundamental é insuficiente para a compreensão do mundo, para garantir plenamente os direitos de cidadania e para a formação adequada da força de trabalho, não podemos ter qualquer dúvida de como será o futuro do país e as perspectivas desses enormes contingentes de pessoas excluídas e  subescolarizadas.
Vale inclusive observar que nossos indicadores educacionais, como o analfabetismo juvenil (na faixa dos 15 aos 24 anos), a evasão escolar antes do término do ensino fundamental e as taxas de inclusão no ensino superior, nos colocam entre os países em pior situação na América do Sul. Estamos lado a lado – ou mesmo abaixo – de países com características bem menos favoráveis para o desenvolvimento escolar, tais como a existência de duas ou mais línguas nacionais faladas por grandes contingentes da população, marcantes diferenças culturais e de atividades econômicas dos grupos populacionais e grande parte da população vivendo longe de centros urbanos. Nenhuma dessas características existe entre nós, pelo menos na proporção que existe naqueles outros países sul-americanos, o que permite concluir que nosso atraso educacional é fruto de políticas de exclusão sistematicamente adotadas ao longo de muitas décadas e cujo resultado foi nos trazer à atual situação.
Só vamos romper com esse atraso educacional quando algumas providências forem tomadas. Entre elas estão o aumento significativo dos recursos públicos destinados à educação, a melhoria das condições de estudo e trabalho nas escolas e o respeito aos ideais republicanos e democráticos, inclusive quanto à “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”, como reza nossa Constituição. Para que tenhamos um real rompimento com a situação atual, devemos atuar desde a educação infantil até a pós-graduação. Devemos, também, fazer com que a educação seja um instrumento de superação das desigualdades – e não de sua reprodução, como ocorre hoje – e recuperar o espaço público, em especial no ensino superior, apoderado por instituições privadas mercantis, com a conivência e o apoio, inclusive financeiro, dos governos.
Além dessas, muitas outras tarefas são necessárias para que o Brasil tome os mesmos rumos que tomaram os países que superaram as barreiras do atraso e da submissão. Há muito trabalho pela frente se queremos oferecer algumas perspectivas otimistas para o país: afinal, o perfil futuro do país é dado pelo perfil atual de seus jovens. E só teremos um país soberano, desenvolvido em termos econômicos, culturais e sociais, e capaz de garantir a todos os plenos direitos de cidadania se construirmos um sistema educacional inclusivo, democrático, igualitário e republicano.
 
Otaviano Helene é professor associado do Instituto de Física, presidiu a Adusp (Associação de Docentes da Universidade de São Paulo) de julho de 2007 a junho de 2009.
Texto publicado originalmente na edição 435 do Jornal Brasil de Fato

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Fotografia parcial da educação brasileira



Só vamos romper com esse atraso educacional quando algumas providências forem tomadas.
 
25/07/2011
Otaviano Helene
 
São muitos os problemas da educação brasileira. E para apontar os possíveis caminhos que devemos seguir para corrigi-los e, também, para entender como e quanto eles contribuem para o agravamento de outros problemas nacionais, tais como a concentração de renda, a pouca qualificação da força de trabalho, a falta de perspectivas de grande parte da nossa juventude ou o nosso atraso social, seria necessário analisá-los detalhadamente.
Entretanto, na impossibilidade de sequer citar todos os problemas do nosso sistema educacional em um curto artigo, uma visão geral do ensino fundamental pode fornecer uma fotografia que, embora parcial, ilustra bem nossa situação. Vejamos. Atualmente, cerca da terça parte das nossas crianças é excluída do sistema  educacional antes mesmo do final do ensino fundamental. Isso corresponde a cerca de um milhão de pessoas abandonando, a cada ano e em definitivo, o sistema  educacional. (Até o final do ensino médio a exclusão já terá atingido perto da metade das pessoas.) Além disso, boa parte daqueles que concluem o ensino fundamental o faz com enormes deficiências no aprendizado, como revelam os muitos testes e exames de desempenho estudantil.
A gravidade dessa situação é enorme, pois esses que hoje deixam o sistema escolar prematuramente estarão ativos, em termos econômicos e sociais, por cinco ou mais décadas. Se já hoje o ensino fundamental é insuficiente para a compreensão do mundo, para garantir plenamente os direitos de cidadania e para a formação adequada da força de trabalho, não podemos ter qualquer dúvida de como será o futuro do país e as perspectivas desses enormes contingentes de pessoas excluídas e  subescolarizadas.
Vale inclusive observar que nossos indicadores educacionais, como o analfabetismo juvenil (na faixa dos 15 aos 24 anos), a evasão escolar antes do término do ensino fundamental e as taxas de inclusão no ensino superior, nos colocam entre os países em pior situação na América do Sul. Estamos lado a lado – ou mesmo abaixo – de países com características bem menos favoráveis para o desenvolvimento escolar, tais como a existência de duas ou mais línguas nacionais faladas por grandes contingentes da população, marcantes diferenças culturais e de atividades econômicas dos grupos populacionais e grande parte da população vivendo longe de centros urbanos. Nenhuma dessas características existe entre nós, pelo menos na proporção que existe naqueles outros países sul-americanos, o que permite concluir que nosso atraso educacional é fruto de políticas de exclusão sistematicamente adotadas ao longo de muitas décadas e cujo resultado foi nos trazer à atual situação.
Só vamos romper com esse atraso educacional quando algumas providências forem tomadas. Entre elas estão o aumento significativo dos recursos públicos destinados à educação, a melhoria das condições de estudo e trabalho nas escolas e o respeito aos ideais republicanos e democráticos, inclusive quanto à “igualdade de condições para o acesso e permanência na escola”, como reza nossa Constituição. Para que tenhamos um real rompimento com a situação atual, devemos atuar desde a educação infantil até a pós-graduação. Devemos, também, fazer com que a educação seja um instrumento de superação das desigualdades – e não de sua reprodução, como ocorre hoje – e recuperar o espaço público, em especial no ensino superior, apoderado por instituições privadas mercantis, com a conivência e o apoio, inclusive financeiro, dos governos.
Além dessas, muitas outras tarefas são necessárias para que o Brasil tome os mesmos rumos que tomaram os países que superaram as barreiras do atraso e da submissão. Há muito trabalho pela frente se queremos oferecer algumas perspectivas otimistas para o país: afinal, o perfil futuro do país é dado pelo perfil atual de seus jovens. E só teremos um país soberano, desenvolvido em termos econômicos, culturais e sociais, e capaz de garantir a todos os plenos direitos de cidadania se construirmos um sistema educacional inclusivo, democrático, igualitário e republicano.
 
Otaviano Helene é professor associado do Instituto de Física, presidiu a Adusp (Associação de Docentes da Universidade de São Paulo) de julho de 2007 a junho de 2009.
Texto publicado originalmente na edição 435 do Jornal Brasil de Fato

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